Quando comentam sobre adaptações de jogos de videogame para mídias audiovisuais, rola esse papo de que quase nada se salva. Muito por o cinema e a TV proporcionarem experiências passivas ao espectador, enquanto os games exigem a participação do jogador na história. Então, não haveria como reproduzir o tipo de empolgação causada em uma mídia para a outra.
Outros, alegam ainda que há uma “maldição” no meio, desencadeada em Hollywood lá atrás, em 1993, com o filme “Super Mario Bros.”, que não teria sido quebrada até então. Bobagem.
Pois a aventura com a dupla de encanadores na década de noventa não é tão ruim quanto dizem, e porque, nesse meio tempo, o que não faltaram foram produções muito bacanas inspiradas em jogos eletrônicos.
De “DOA: Dead or Alive” aos “Resident Evil”, passando pelos recentes “Cuphead”, “The Last of Us”, “Arcane”, “Angry Birds”, “Sonic” e “Mortal Kombat Legends: A Vingança de Scorpion”. E quando voltamos os olhos ao Japão, a lista é extensa e já antiga: “Pokémon”, “Medabots”, “11eyes”, “Super Onze”, “Steins;Gate”, “Fatal Fury”, “Monster Rancher”, “Street Fighter” e seguem opções.
Com esse histórico, um filme ótimo como esse novo “Super Marios Bros.” não chega a ser impressionante, transgressor, ou uma quebra de paradigma. Mas ele é, talvez, a melhor adaptação de um jogo para as telonas que temos até o momento.
Produzido pelo estúdio Illumination (da franquia “Meu Malvado Favorito” e de pérolas agridoces recentes do cinema em animação como “Sing – Quem Canta Seus Males Espanta” e “Pets – A Vida Secreta dos Bichos”) e com a direção dividida por Michael Jelenic e Aaron Horvath (que também fez o bonitinho “Os Jovens Titãs em Ação! Nos Cinemas”), o longa-metragem é uma injeção de serotonina tanto a fãs de longa data dos personagens da Nintendo, quanto à molecada que entra em contato com esse universo pela primeira vez.
A história é simples, tal como a do jogo: os irmãos Mario e Luigi deixam seu emprego para formarem a Super Marios Bros., uma companhia de encanadores no Brooklyn, em Nova Iorque. Ao tentarem resolver um vazamento que está alagando parte da cidade, a dupla é sugada por um cano verde misterioso que os joga em outro universo.
Separados, eles descobrem que tal mundo está sendo devastado por um exército de tartarugas punks comandado pelo grandalhão Bowser. O monstrão foi de reino em reino para subjugar seus moradores com o intuito de capturar uma estrela lendária com a capacidade de aumentar seus poderes. Agora que ele a tem em mãos, seu objetivo é marchar ao Reino do Cogumelo para capturar a princesa Peach e obrigá-la a se casar com ele.
Ocorre que Luigi foi parar no Reino das Sombras e é capturado pelo exército do Bowser. Já Mario foi direto ao Reino dos Cogumelos, e é guiado pelo seu novo camarada Toad e pela princesa Peach para enfrentar o tartarugão e salvar seu irmão. Para isso, eles contam ainda com a ajuda de Donkey Kong e os macacos do Reino da Floresta.
Jelenic e Horvath criam então uma aventura colorida, ágil, cheia de coração e sem um pingo de cinismo. E que vai muito além de easter eggs (são vários!). Eles não se limitam em só utilizar os personagens, o universo e o lore das propriedades intelectuais envolvidas e abraçam elementos que são comuns aos jogos dentro da narrativa.
Há uma cena bonita demais logo no começo, onde Mario e Luigi precisam atravessar o bairro para chegar na casa de uma cliente. Toda ela é montada em uma perspectiva de tela “2D”, em que itens do cenário urbano servem como obstáculos.
Numa outra, adiantada no trailer, Mario enfrenta o Donkey Kong num cenário inspirado nos jogos “Super Smash Bros.”, onde são replicados alguns estilos de afastamento e aproximação de câmera presentes no game.
Um segmento mais pro final, talvez o mais impressionante em todos, é com os personagens em uma corrida “Mad Max” pela Rainbow Road, dos jogos “Mario Kart”. O filme eleva aquele pensamento de “e se pudéssemos sair da estrada” a um outro nível.
Assisti ao filme em uma sessão lotada, cheia de crianças, e é interessante observar a reação da molecada ao que os diretores queriam passar utilizando técnicas cinematográficas.
Por exemplo, numa cena, enquanto desbrava o Reino dos Cogumelos pela primeira vez, Mario corre por cima da cidade pulando em blocos. Pra dar a impressão de perigo com a altura, os diretores posicionam a câmera por cima do personagem e desfocam o cenário lá embaixo. Quando esse fundo desfocado entrou em quadro, os pirralhos vibraram.
O cinema não necessitava de um salvador no quesito de adaptações de videogames. Então, sem se preocupar com isso, “Super Mario Bros.” pode ocupar o lugar de melhor entre as tantas boas transposições de telinhas e joysticks para as telonas. É um filmaço, para crianças de verdade e para a criança que habita cada um de nós.